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Quanto vale a sua privacidade? 

Isadora Octávia Ribeiro Godinho*

Todos os dias nos deparamos com situações em que a privacidade de indivíduos é invadida. Seja por serem celebridades e a mídia utilizar-se de sua imagem para vender notícias sobre a sua vida íntima, seja de pessoas comuns, como eu e você, que mesmo não querendo ou não tendo conhecimento, somos rastreados através dos nossos aparelhos eletrônicos que carregamos conosco os quais sempre são alimentados com nossas informações. 

O que me fez pensar: quanto está valendo a nossa privacidade? isso mesmo: qual o valor da privacidade? Nossos dados pessoais em si, sabemos que “são de milhões”, mas penso no todo, ou seja, a nossa privacidade e tudo o que ela engloba. 

Casos de vazamentos de dados pessoais

E a partir dessa ótica, eu trago à tona a tão comentada história que envolve a atriz Klara Castanho que teve que lidar com o vazamento de informações íntimas suas decorrentes de uma violência que sofreu. Segundo a própria, em uma carta aberta em suas redes sociais, logo após ter dado a luz a um bebê, ela foi abordada por uma enfermeira que lhe falou: “imagina se tal colunista descobre essa história?”.

Klara havia sofrido um estupro e teve que lidar com a invasão de sua privacidade, com o vazamento dos seus dados (dados esses sensíveis, diga-se de passagem) e os da criança que ela acabara de dar a luz, o que torna o caso um tanto mais grave, haja vista que as informações da criança, aos olhos da lei, devem ser protegidas com maior rigor. 

LGPD e informações de crianças e adolescentes

A LGPD estabelece que, quando se trata de dados de crianças e de adolescentes, o seu tratamento deve ser feito mediante consentimento específico dado por, pelo menos, um dos pais ou responsável legal (parágrafo 1° do artigo 14 da LGPD) e nada disso foi feito ou respeitado. 

Outra celebridade que sofreu com o vazamento de seus dados e a consequente invasão de sua privacidade foi a influencer Gabi Brandt. Recentemente, a moça desabafou que, durante a sua ida ao hospital para fazer alguns exames, uma funcionária do local havia vazado uma foto do seu prontuário em que continha informações suas, gerando especulações das mais diversas na mídia e acarretando para a titular dos dados um desconforto extra além do seu estado de saúde.

Direito de indenização e o valor da privacidade

Mais recentemente, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo decidiu pelo direito de indenização pelo vazamento de informações sobre gravidez que a egrégia corte entendeu tratar-se de um dado pessoal sensível. No processo em questão, a autora alegou que descobriu a gravidez em dezembro de 2020 ao realizar exames laboratoriais, mas que, em fevereiro de 2021, sofreu um aborto e que, logo após o ocorrido, foi contactada via WhatsApp por um laboratório, oferecendo os seus serviços de coleta e armazenamento de cordão umbilical, sendo que ela nunca havia compartilhado os seus dados com a referida empresa. 

A 1ª Câmara de Direito Privado do TJSP entendeu que houve um compartilhamento indevido dos dados da reclamante e decidiu pela condenação por danos morais do laboratório no valor de 10 mil reais por entender que, além de outras coisas, houve uma violação do direito de privacidade da autora. 

O que esses casos têm em comum? A violação de direitos fundamentais como a privacidade e intimidade do indivíduo, previstos constitucionalmente e que são justamente uma característica essencial que lhe é atribuída, a fim de controlar todas as informações a seu respeito. Sendo por esta razão também, pilar da Lei Geral de Proteção de Dados, o que garante a esse titular dos dados um maior aporte até mesmo para assegurar a si a sua dignidade humana, vide os casos mencionados acima, em que todas essas mulheres sofreram um atentado contra os seus direitos e tiveram sua intimidade exposta, ficando sujeitas a todo tipo de julgamento. 

Cenário atual das tecnologias x privacidade

A verdade é que, em tempos de tecnologias super avançadas (câmeras, aparelhos celulares etc.), a nossa privacidade encontra-se tentando a todo momento equilibrar-se numa corda bamba. O que mais vemos nos dias de hoje são empresas e pessoas objetivando o lucro a todo custo em cima de um dos nossos direitos mais caros: a nossa privacidade e intimidade. 

Benefícios para as empresas de dar o devido valor à privacidade

Por isso a necessidade urgente de buscar meios de proteção dos nossos dados pessoais e a Lei Geral de Proteção de Dados objetiva justamente isso. Confundem-se aqueles que a enxergam apenas como um mecanismo inibidor das suas atividades empresariais. Ao contrário, uma empresa comprometida com os direitos dos seus clientes é uma empresa que carrega consigo não somente o seu caráter inovador, mas também é passível de confiança, credibilidade agregando à sua imagem um caráter positivo de solidez e confiabilidade. Que empresa não quer esse status no mercado? 

O valor da privacidade perpassa pelas mãos do comprometimento de empresas que, por meio de profissionais qualificados, estabelecem a cultura do privacy by design, criando desta forma um “efeito cascata”, disseminando essas novas diretrizes para todos os seus profissionais. 

Assim, o profissional que te atendeu e coletou seus dados, a pessoa do marketing que te enviou um e-mail oferecendo um serviço, a enfermeira que te acolheu e te fez sentir inseguro num momento de vulnerabilidade são parte de uma balança que está sempre em busca do equilíbrio entre o seu direito à privacidade e proteção dos seus dados e o livre exercício de empresas em utilizá-los de maneira correta e segura. 

E quando, porém, essa balança pende mais para um determinado lado (geralmente esse lado é o oposto do titular dos dados), cabe então à deliberação judicial restabelecer o equilíbrio gerando uma alta conta a ser paga e sem direito a troco.

Leia outros artigos da autora: 

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Isadora Octávia Ribeiro Godinho: Advogada – 25947 OAB/PA, Pós-Graduada em Direito Constitucional. Apaixonada pela proteção e privacidade de dados, uma inquietação antiga que veio à tona novamente com a promulgação da Lei Geral de Proteção Dados.

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