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Metaverso, planejamento patrimonial e ativos digitais

Mirian Lima Machado*

Carolina De Gioia Paoli**

O planejamento patrimonial apesar de relevante para segurança, proteção e regularidade dos ativos detidos por determinada pessoa ou família ainda não obteve a atenção devida por parte dos brasileiros. Há aspectos culturais e educacionais que justificam tanto a falta de procura de assessoria prévia, no momento da aquisição e formação do patrimônio; quanto à resistência para planejamento das disposições sobre a transmissão dos bens, após a morte de seu titular ou titulares.

Compreender a importância do planejamento patrimonial exige o conhecimento dos riscos de perda, desvalorização, custos gerais, desembolso com impostos e taxas, conforme a natureza do bem e/ou dos bens acumulados.

Tradicionalmente, problemas relativos à aquisição de bens imóveis sem as devidas análises de passivos fiscais e cíveis, constantes em certidões, a realização de construção de casas em terrenos, sem a devida regularização junto à Prefeitura, e a permissão para uso gratuito sem a formalização das regras configuravam os principais e mais vultosos problemas de planejamento patrimonial que tinham repercussão com problemas jurídicos sentidos por seu titular em vida; ou, ainda, com dificuldades de regularização post mortem impondo prejuízos e morosidade aos herdeiros.

Planejamento patrimonial e ativos digitais

Se, nesse cenário tradicional, a união entre planejamento patrimonial e sucessório já se demonstrava fundamental para segurança e proteção dos bens, a variação nas espécies de ativos que compõem o patrimônio, com inclusão de criptomoedas, tokens fungíveis e não fungíveis (NFTs), os quais podem ser representativos de bens virtuais, conjugados com reconhecimento de direitos, presentes ou futuros, geridos de forma descentralizada, por plataformas autônomas, exchanging ou, até mesmo, exclusivamente por seu titular, por meio de carteiras conectadas ou não as redes de internet, tornam o planejamento essencial para a manutenção e transmissão do patrimônio post mortem.

Primeiro porque a regularidade dos investimentos por meio de plataformas descentralizadas é essencial para que o titular não seja vítima de fraudes e pirâmides financeiras, cuja ocorrência tem se tornado frequente e em vultosos valores. 

Segundo – e ainda mais importante – porque a forma de gestão descentralizada desses ativos dificultará o encontro regular por parte dos herdeiros; a compreensão da composição do valor total da herança, sendo esse dado essencial para realização do inventário com a transmissão definitiva dos bens aos herdeiros e, sobretudo, gerará uma insegurança jurídica quanto à regularidade da partilha realizada, possibilitando que os interessados entrem com sucessivas demandas de investigação de patrimônio sonegado. 

Logo, para aqueles que entendem que a utilização das criptomoedas e dos tokens são boas formas de investimento, formação e acumulação de capital para utilização em vida, é preciso de uma orientação jurídica a respeito dos diferentes instrumentos existentes, já assegurados, para viabilizar a transmissão desses ativos aos herdeiros, dentro das vontades e expectativas de seu titular. 

Já, aos que pretendem a utilização desses ativos como forma de não respeitar as regras impostas pela lei para sucessão legítima, é imprescindível reconhecer que há inúmeros instrumentos que permitem o reconhecimento da sonegação de bens, ainda que consubstanciados em bens digitais geridos de forma descentralizada, gerando não apenas a invalidade de transmissões não regulares, como insegurança jurídica para todos os envolvidos. 

Planejamento patrimonial e metaverso

Tal realidade e destaque se torna ainda mais evidente com a força e alcance dos diferentes metaversos que, não se tratam mais de plataformas com nichos específicos, destinados sobretudo aos gamers e amantes da tecnologia. Ao contrário, se tratam de ambientes dentro dos quais haverá reprodução de atividades rotineiras e cotidianas dos diferentes nichos de mercado, incluindo aqueles tradicionais como os voltados à segurança e saúde; ao jurídico; e àqueles de grande relevância econômica, com grandes marcas de varejo, da indústria alimentícia e do esporte realizando aportes e investimentos destinados à formatação desse novo ambiente de relações pessoais, comerciais e de trabalho. 

Diante dessa inafastável reconfiguração de espaços e formas de acumulação, gestão e aplicação dos bens e direitos conquistados, o planejamento patrimonial e sucessório se torna uma etapa integrante e – indispensável – do planejamento financeiro, devendo estar presente desde o momento prévio à realização do investimento, até o acompanhamento periódico de suas modificações. 


Referências 

BLOOMBERG LÍNEA. Depois das empresas, Estados estão de olho no metaverso. Disponível em: https://www.bloomberglinea.com.br/2022/01/07/depois-das-empresas-estados-estao-de-olho-no-metaverso/. Acesso em: 08 nov. 2022.

KEPPEN, Mariana; PIRONTI, Rodrigo. Metaverso: novos horizontes, novos desafios. International Journal of Digital Law, Belo Horizonte, ano 2, n.3, p. 57-67, set/dez 2021. DOI: 10.47975/IJDL.pironti.v.2.n.3

MOSMANN, Gabriela. Planejamento patrimonial é a chave para continuação de um legado. Disponível em: https://www.suno.com.br/artigos/planejamento-patrimonial. Acesso em 09 nov. 2022. 

SCHLEMMER, Eliane  e  BACKES, LucianaMetaversos: novos espaços para construção do conhecimento. Revista Diálogo Educacional [online]. 2008, vol.08, n.24, pp.519-532. ISSN 1981-416X.

SAÚDE DIGITAL TECH. Metaverso e saúde. Disponível em: https://saudedigital.tech/metaverso-e-saude. Acesso em: 08 nov. 2022.


Mirian Lima: Coordenadora da ANPPD Regional São Paulo. Coordenadora Geral ANADD. Professora e Consultora em Proteção de Dados. Formada em Direito pela PUCPR. Pós-graduada em Direito Constitucional Tributário e Privacidade de Dados (FAMESP). Membro do Grupo de Pesquisa LGPD da PUCPR. Membro da Comunidade Mulheres da LGPD. Fundadora do METASAFE

Carolina De Gioia Paoli: Advogada especializada em Planejamento Patrimonial, Familiar e Sucessório. Sócia fundadora do Gioia Paoli Advogados. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Pacto Federativo, Tributação e Financiamento dos Direitos Sociais. Mestre e Doutoranda em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professora de Direito das Sucessão na Universidade Presbiteriana Mackenzie. 

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