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A Lei de Proteção de Dados no esporte

Eliza Margini*

Em 2018, o Brasil publicou a Lei 13.709/18, a Lei Geral de Proteção de Dados, conhecida como LGPD, que dispõe sobre o tratamento de dados pessoais por pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, no meio físico e virtual, conforme consta em seu artigo 1º.

Porém, a Lei vem sendo especialmente associada à proteção dos dados dos consumidores, quase como uma extensão do Código de Defesa do Consumidor e, por isso, o debate sobre o tratamento e a privacidade dos dados pessoais sensíveis está sendo negligenciado por outros setores, como, por exemplo, o desportivo.

À vista disso, poucos clubes possuem políticas de proteção de dados, sendo evidente que a administração das entidades desportivas precisa de uma mudança radical, pois, considerando o apresentado na Lei, é possível afirmar que os clubes, federações e confederações, efetuam com frequência o tratamento de dados pessoais de funcionários, atletas, torcedores, e outros.

Dados pessoais no esporte e nos clubes

Desta forma, é importante esclarecer que o “tratamento de dados pessoais”, para a LGPD, é qualquer operação feita com o dado pessoal, inclusive o simples armazenamento. Então, dentro deste grupo de dados pessoais que são tratados por clubes, estão, por exemplo, os dados pessoais sensíveis, dispostos no inciso II do art. 5º da LGPD, ou seja, são aqueles dados que podem causar discriminação a uma pessoa, e, por isso, merecem maior proteção: origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa natural.

Para ter uma ideia, tente visualizar os dados pessoais coletados por meio de aparelhos eletrônicos que monitoram a saúde e o desempenho dos atletas. Estes dados são captados durante os jogos e também nos treinos, somando, assim, uma quantidade relevante de informações relativas à saúde. Entretanto, a análise destes dados coletados ajuda os clubes de futebol a manterem os atletas no auge da aptidão física, pois podem detectar até mesmo lesões leves antes que elas se tornem graves. Vê-se que a capacidade de coleta de dados pessoais sensíveis é gigantesca no universo dos esportes.

Tratamento de dados legítimo

Porém, para que o tratamento de dados pessoais seja considerado legítimo, o agente de tratamento deve se atentar a uma das dez bases legais trazidas no artigo 7º da LGPD, e isto significa que a lei determina que, para cada operação que o clube fizer com o dado pessoal, deve haver necessariamente uma base legal que a sustente, ressaltando ainda, que a lista de bases legais para o tratamento de dados pessoais é taxativa, ou seja, caso um determinado tratamento não se enquadre em uma das hipóteses legais, este será necessariamente, irregular.

Já, em caso de dados pessoais sensíveis, as hipóteses de tratamento de dados são bastante limitadas, sendo necessário observar o artigo 11 da LGPD, que oferece oito hipóteses específicas.

Lei Geral do Desporto (“Lei Pelé”) – Lei 9.615/98

A Lei Pelé prevê em seu artigo 82-A que “as entidades de prática desportiva de participação ou de rendimento, profissional ou não profissional, promoverão obrigatoriamente exames periódicos para avaliar a saúde dos atletas, nos termos da regulamentação.” (grifo nosso)

Porém, não é ofertado ao empregador desportivo o direito de manipular e cruzar dados em exames médicos e clínicos para desistir ou vedar discriminatoriamente a contratação do atleta em transferência, sob pena de configurar atitude discriminatória ilícita e abusiva na contratação laboral. Ainda, é importante esclarecer que os clubes não devem disseminar informações de antecedentes criminais dos atletas em transferência ou contratação, nem mesmo se houver tramitação de processo penal, pois a atividade de jogador profissional é pública e sempre exercida em companhia de diversos empregados do clube.

Por fim, diante das questões apontadas, é de extrema importância que a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (“ANPD”) se posicione em relação à base legal mais adequada ao tratamento de dados pessoais sensíveis dos atletas.

Bibliografia:

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9615consol.htm

https://www.conjur.com.br/2022-fev-15/opiniao-lgpd-esporte-base-legal-tratar-dados-atletas

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Eliza Margini: Supervisora na assessoria jurídica M.A.C Barbosa Sociedade Individual de Advocacia, com atuação de mais de 13 anos na área cível, especialmente contencioso bancário e consumerista. Em 2020, iniciou a pós-graduação em Direito Digital e a atuação em projetos que buscam conformidade de empresas em seus processos nas áreas de: Governança, Proteção e Privacidade de Dados (LGPD e GDPR), Compliance, Gestão de riscos, Controles Internos, Auditoria, Treinamento e Gestão de Processos.

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